segunda-feira, agosto 09, 2010

Buscando A Razão No Espelho.




O prazer se separa da dor em módicas medidas,
Gosto da faca enterrada no peito,
Sangrando a lágrima de amores sem resposta.
Minha melancolia respira em cada orgasmo sufocante,
Perco-me sempre em seus cabelos,
Junto as pernas.

Sento em frente ao computador,
fugindo da realidade,
ou de qualquer contato físico.
É um fiasco.
Logo procuro outro tipo de dor que possa me levar ao prazer,
ao gozo sem fim.
O prazer misturado a dor.

De volta a realidade esqueço seu nome,
Lembro da dor,
Mas esqueço seu nome.
Lembre-me seu nome,
Para eu esquecer a dor.

As paredes guardam os segredos,
Sussurros de um desnível da sanidade,
Guarde pra mim este doce pra quando eu voltar.

A rua faz com que eu me perca,
Pra me achar no canto de um quarto escuro,
confuso no corpo,
na orgia da lua.
Quero ser a sua salvação,
Pra junto me levar ao paraíso.

E volto para o meu singular prazer,
O cotidiano desvairado,
Com o vigor de toda minha fraqueza.
Aconselhe-me a dor do futuro,
Pra relaxar.

Todos num mesmo tempo,
Em diferentes ritmos.
Cadê a luz,
Cadê meus passos confiantes,
Afogaram-se em prantos sorrisos.

A liberdade é uma risada contida,
Num murmúrio perdido da razão. 

terça-feira, junho 15, 2010

O Silêncio Do Tempo.


Meu período está passando,
enquanto me vejo em visões futuras.
O tempo sempre me ajudou,
agora deverá me pegar pelo braço,
e me deixar sozinho em meio às trevas.
A saída nunca houve,
apenas o desejo inútil de viver na luz.
E ela se extingue lentamente.
Vivo a vida em mil segundos por milésimo de segundos,
e um dia talvez,
iremos nos esbarrar em nossos tropeços,
caindo em nossa realidade concluiremos
Que a vida existe,
ainda renegada pela escuridão de alguns.
Toda jornada fará sentido,
mesmo que meus olhos não suportem tal luz.
O vento sussurrará meu nome em uma língua desconhecida,
quem sabe alguém ouça,
ou seja apenas uma alucinação esquizofrênica.
Meu passado se torna um sonho,
Cuja realidade ninguém entendeu,
somente a incontestável dor.
E voltar, não sei como,
estendo meus braços querendo que algo mais me leve,
mas apenas o tempo me carrega.
Muitos vão se ajoelhar e rezar,
não percebendo que o medo é apenas uma miragem,
E nada vai afugentá-lo,
nem mesmo qualquer tipo de luz.. 
Lobato Dumond.

segunda-feira, abril 19, 2010

Guarda Tudo.





O asfalto inebriava a imagem com o calor recebido do sol. A rua tranqüila recebia poucas pessoas que por ali passavam; Um Gari Meio Manco varria as ruas imundas da desordem. Nos movimentos lentos da vassoura, ele carrega o lixo de um lado para outro orquestrando a cadência da lentidão; Uma Senhora de Idade arrasta um carrinho de compras cheio, levando um pé de cada vez e sustentando para frente toda sua corcunda; Um Menino com sua mochila volta da escola para casa, observando o tempo e as árvores com curiosidade, sem perceber que o tempo se move junto com ele; um cachorro dorme na preguiça da vagabundagem, indiferente a fome. Na violência do abrupto um homem magro dobra a esquina correndo no desespero da loucura, vestindo terno e gravata num calor de quarenta graus, ele transpira toda sua velocidade em segundos; correndo, correndo e correndo. Cruzando a rua numa agilidade incrível, o Engravatado sente suas pernas doerem e seus joelhos afrouxarem, e quando achou que iria cair, correu mais e mais.
O Engravatado saía de casa por volta das oito da manhã, teria que chegar ao trabalho um pouco mais cedo. Descia de elevador com uma carranca e os olhos vidrados em sua esposa Amanda, aparentemente tiveram alguma discussão. Amanda era uma mulher extremamente elegante, andava sempre vestida na moda e possuía lindas curvas de Tamburello. O Engravatado não dizia nada, apenas encarava, enquanto Amanda desviava o olhar, talvez de culpa. Na calçada cada um foi para o seu lado, sem despedidas, beijos ou afagos. Amanda pegou o carro do casal. O Engravatado decidiu ir de Metrô.
Era tudo um tumulto só, filas e pessoas se espremendo por algum espaço de centímetros quadrados. A careta apenas ficou mais evidente e, mesmo com ar condicionado, era impossível não suar ali dentro. “O tempo passa devagar, quando se está na merda”; Uma eternidade de empurra-empurra até ser cuspido na carioca. Atravessa a rua na faixa de pedestres acompanhado de inúmeras formigas trabalhadoras, sem saber que seus segundos de vida corriam rápido como elas. Pegou o elevador num prédio comercial e, por coincidência, encontrou sua secretária. Os olhares se cruzaram cúmplices, deixando evidenciar uma intimidade proibida. Houve apenas um oi para tentar esconder a excitação aparente. Ao sair do elevador, foram juntos até o café do grande escritório, trocando algumas confidências, sem dar muita pinta, disfarçando ao máximo para os outros profissionais. Sugeria negócios. Conversa restrita no trabalho é um engodo muito interessante, aumenta o fetiche; parece o que realmente não o é. O Engravatado Entrou na sala e colocou o café perto de uma montoeira de processos, no mesmo tempo em que a Secretária se sentou à mesa mais afastada. Logo na tela do computador havia um recado que dizia: Paulo, não poderei vir hoje, por isso fiz plantão ontem. Att. Pablo. Seu cenho fechou. Saberia que o dia seria mais puxado. A Secretária entra novamente, fazendo-o pensar:
“Caralho, eu vou comer muito ela na hora do almoço, preciso extravasar” – Diga Rita. - trincou num sorriso cafajeste.
- Acho que nossos planos afundaram, bebê. – Falou carinhosa sem perder a postura.
- Como assim?
- Você leu o recado do Pablo? Ele não vem. Ele ia numa audiência na vara criminal de Nova Iguaçu. Ver aquele processo da mãe do traficante que recebeu um carro dum jogador. Só tem você para fazer esta audiência. Você vai ter que sair agora. Não vamos poder almoçar juntos, mais uma vez. – Terminou a frase magoada, afinal ela tinha 18 anos.
Paulo virou puto esbarrando no copo de café e o deixa cair em cima de alguns processos. Desesperado, limpa alguns com a gravata, pega a maleta e coloca os processos dentro. Antes de sair, para do lado de Rita, ainda parada na porta, e diz:
- Eu juro que volto pro jantar. – Enfatizando o Eu.
Pegou um ônibus pra Nova Iguaçu no Castelo. Puxou um livro de Charles Bukowski e mergulhou de cabeça. As palavras das ruas mudavam conforme as paisagens do livro; ao redor a cidade; suas ruas tortuosas se perdiam em movimentos inúteis. Um livro faz uma grande viagem, em todos os sentidos. Logo pelas tantas percebeu que já chegara à Nova Iguaçu e precisaria pegar outro ônibus para a Vara Criminal. Desceu no ponto e ficou esperando. Não demorou muito. Paulo vê seu ônibus parado no sinal e com a porta de entrada aberta. Deu uma corridinha até ele e entrou. O ônibus era daqueles modelos antigos, com a entrada e o a cabine do Trocador pela porta traseira. Paulo entrou meio estabanado, quase catando cavaco, não teve coragem de olhar para a cara do Trocador, teve vergonha. Deixou o dinheiro e passou, sentando-se logo ao lado de uma Senhora Gorda num dos bancos mais altos e a frente do trocador. Não demorou muito para mais uma vez amaldiçoar todos os deuses, afinal, tem dias em que você está num mato sem cachorro, e o seu gato morreu. Puxou o livro do Bukowski, quando foi interrompido pela Senhora Gorda que sentava ao seu lado.
- Guarda tudo que você tem de valor. – A face da Senhora era de pânico.
“não acredito que esta puta vai me assaltar” – Como? – respondeu.
- Guarda tudo que você tem de valor. O ônibus está sendo assaltado. – A Senhora parecia bastante aterrorizada. – Aquele Cara e a Mulher dele estão roubando todo mundo, moço. – Um Cara estava sentado do lado de uma adolescente, com a arma na barriga dela, ao mesmo tempo em que a Mulher dele ficava ao lado do Motorista, sempre falando com este e olhando para frente. Não acreditando no seu dia, ele apenas paralisa e observa tudo calado. O sangue queima e as mãos gelam. Uma evangélica rezava muda pra todos os Santos e orixás; a maioria dos passageiros fitava o chão com medo. Todos muito quietos, no instante em que a Senhora Gorda ameaça a perder a razão.
- Moço, acho que vamos todos morrer.
- calma que tudo se resolve na paz.
- Vamos todos morrer, moço. - Ela esfregava as mãos intensamente e soluçava num choro contido.
“se eu ficar do lado desta surtada, vou tomar um tiro de bobeira”.
Sem falar nada, ou pensar muito, levantou-se desviando seu olhar dos assaltantes, e por sorte ambos não o viram. Sentiu-se invisível. Caminhou decidido buscando não fazer muito barulho com os passos, chegou atrás da cabine do Trocador e sentou-se, “pelo menos aqui eu tenho um escudo”. Ambiente tenso no ônibus. O silêncio incomodaria um surdo. Não haveria muito a ser feito, “quem realmente quer tomar um tiro pelas coisas materiais, valeria a pena se fosse uma questão moral”?  - Pensou.
Espichou o olhar por de trás da poltrona do Trocador; o casal de Malandros falava com o Motorista ajeitando os frutos do roubo, nos bolsos e dentro da calça. O Ônibus pára em um ponto e os dois Malandros descem. O Mais curioso era que o Cara Assaltante carregava com dificuldades uma máquina de secar louça. Paulo seguiu com os olhos os dois pela rua, com o Cara a carregar a máquina na cabeça com dificuldades e tentando correr.
Subitamente o reboliço tem seu estopim numa frase – “Minha Nossa Senhora da Aparecida, Oxum, Oxalá, Jesus Cristo é o Senhor! – A Evangélica agradecia seu Deus e todos seus santos por nada ter lhe acontecido. Todos comentavam o pavor e o terror de viver tal experiência, alguns comentavam por alto:
- Aquele Senhor ali estava com uma máquina de secar louça, e os bandidos levaram.
- Levaram meu relógio também.
- Meu pagamento todo foi com estes Filhos da puta!
Diante o tumulto dentro do ônibus, o Motorista para na rua ao lado de uma patrulha de policia um pouco mais à frente, contado o caso como ocorrera e especificando que o casal carregava uma máquina de lavar louça. Não foi nem dez segundos depois que o policial dissera ao rádio como era o casal de ladrões, e o que carregavam, prenderam os Malandros. Quando comunicaram aos passageiros, foi só alegria. Todos se cumprimentavam. Inclusive a Evangélica foi dizer ao Paulo que não morreu por rezar o Salmo 26 e prometer a Iemanjá três lírios.
Devido aos procedimentos legais dito pelo policial, todos do ônibus teriam que ir até a delegacia para fazer o Boletim de Ocorrência. Muitos começaram a reclamar, inclusive Paulo que não poderia perder em hipótese alguma sua audiência. Um novo reboliço fora formado. No meio da discussão o Motorista tentou sair com o ônibus, resvalando de leve num carro que se movia ao lado. Evitando maiores danos ao automóvel, o Motorista dá uma freada brusca, levando uns dois ou três passageiros ao chão. A confusão estava tomada, alguns desceram do ônibus e o dono do automóvel começou a gritar da rua. O policial tentou conter a ordem, mas era apenas um para tantos infelizes. Paulo aproveitou a desordem e saiu de manso com seus passos curtos e decididos, e foi só passar a traseira por fora do ônibus, saiu em disparada.
Um Gari Meio Manco varria as ruas imundas da desordem. Nos movimentos lentos da vassoura, ele carrega o lixo de um lado para outro orquestrando a cadência da lentidão; Uma Senhora de Idade arrasta um carrinho de compras cheio, com dificuldade levando um pé de cada vez, sustentando para frente toda sua corcunda; Um Menino com sua mochila volta da escola para casa, observando o tempo e as árvores com curiosidade, sem perceber que o tempo se move junto com ele; um cachorro dorme na preguiça da vagabundagem, indiferente a fome. Na violência do abrupto Paulo dobra a esquina correndo no desespero da loucura, vestindo terno e gravata num calor de quarenta graus, ele transpira toda sua velocidade em segundos; correndo, correndo e correndo. Cruzando a rua numa agilidade incrível, Paulo sente suas pernas doerem e seus joelhos afrouxarem, e quando achou que iria cair, correu mais e mais.
Não agüentado dar um passo sequer, parou escorado num poste e começou a respirar todo o ar que podia; se ar tivesse preço, Paulo estaria morto. No meio de suas blasfêmias, acaba vendo ao seu lado a entrada da Vara Criminal que tanto lhe esperava. Agora tudo fazia sentido; gargalhou ao máximo. A Senhora de Idade o olhava incrédula, enquanto Paulo gargalhava o resto de sua razão.    

sábado, abril 17, 2010

Bocas Eternas.




Eu tento justificar minhas ações,
Sendo aquilo que meus instintos dominam, e ao mesmo tempo, carregar toda paixão da razoabilidade. Seduzo a loucura em forma de pornografia, num beijo encharcado de despudor. Saboreio o gosto da boceta num pingo de baba. O erótico é meu amor. Cruzo o país em busca do seu corpo. Vivo intenso cada foda, num minuto de cena. A imagem que me persegue é de quatro, explicita. Esquecer?
Talvez saborear.
Estou vivo na madrugada eterna; na noite em que o sol morreu, a tarde não estava lá. Posso rir no eterno gozo da minha morte, talvez eu não esteja presente no dia em que acontecer, mas talvez você esteja. Quero ver e sentir o tempo que consome minha pele; destruindo minhas unhas; enrugando a flexibilidade; caindo meus dentes.
Contudo o desejo permanece inflexível, nem que eu me drogue; foda-se.
O Tempo urge, e longa se tornou a espera. O amor sempre numa vaga lembrança, em planos diferentes surreais. O relógio apurado derretido no calor do seu corpo.
Rígido é o meu amor por ti.
A saudade inundou minhas lembranças. Penso em lhe esquecer numa fração do tempo,
E no milésimo de segundo seguinte transpiro seu nome. Preciso me enterrar no longínquo subconsciente,
Em minha frágil máscara deformada.
O chão se derrete junto ao relógio.
Imagino coisas e vejo um novo mundo de idéias, sendo aquilo que eu quiser, aonde eu sempre poderei estar. O prazer se torna minha linguagem do saber, mas nunca sei exatamente onde estou. Vago de psíquicos a matérias na busca irrefreável dos sentidos, tento conhecer antes de partir, dominar a razão.
A palavra da sua boca é a violência no meu corpo, aquilo que nunca será meu, também não o será de ninguém. Os sussurros carregam lembranças e o tempo junto; voando almejando o fim. A dor pode ser um gozo na carne. Extirpo a razão num descontrole ao puxar seu cabelo. Cuspo na sua cara num tapa impetuoso, o estalo é uma brincadeira do som. Penso que você não conhece a dor, e tudo é um jogo perigoso, assim a como; as palavras. Não me diga nada, apenas encaixe, desperte. Ajoelhe-se e jure.
Faça valer o desperdício, chupe e engula; quero sua língua.
Passo pelas portas em que você esteve, sinto o perfume que marcou nossos encontros; tudo tão longe e tão intenso que me deixo explodir;
Minhas mãos tremem lhe vendo em pequenas cenas sem pudor, não me deixe aqui, leve-me contigo pra dentro de você.
Tudo se move com extrema velocidade, menos eu, continuo parado num tempo vagaroso, envelhecendo as pedras, e consumindo meu ser.
Vejo derreter a máscara que você me deixou,
Porém a vida, sempre se alimentará da vida.  
Lobato Dumond.

segunda-feira, março 22, 2010

O Último Segundo




Prefácio.
O tempo é uma certeza de vida, tanto quanto o de morte; e a vida é o que você leva pra eternidade, você querendo ou não. No momento em que ela se extingue, o que você leva, é o seu ultimo segundo. Então cuide deste último segundo.

Precisava chegar a Praça Mauá, sendo que me encontrava na Lapa. O calor continuava a matar os pingüins do mundo, enquanto eu derretia a minha calota polar. Os passos arrastavam meu corpo pela Mem de Sá. Um ônibus parou de relance ao meu lado, impossível andar neste calor até a Praça, então logo entrei no ônibus, mesmo sem saber o número – Este ônibus passa pela Praça Mauá? - perguntei.
- Devo passar por lá sim. – Resmungou o Motorista estabanado, não sabia se partia; se ficava; se olhava pelo retrovisor; ou se olhava pra frente. O Motorista tinha uma cara carrancuda, e em gestos afoitos recebeu meu dinheiro. Alguém teve a brilhante idéia de colocá-lo trocador e motorista, não é à toa que estava perdido. Peguei meu lugar e comecei a desfrutar do abismo que pode ser a Lapa; ruas lotadas de transeuntes a descer e subir; Muitos vislumbram de frente e encaram a possibilidade do pulo, afinal, todo abismo é um convite a pular. Um Senhor Manco se aproximou do Motorista, trajava uma camisa esburacada, sua voz era lenta e estridente.
- Meu bom homem, este ônibus passa na Rua México? – Trazia na voz a humildade de quem se espatifou numa queda impossível, vai ver era o abismo. Sentou-se perto de mim, não ao meu lado, e continuamos viagem. Subitamente o ônibus gira numa curva em uma ruazinha que ninguém conhecia. Ocorre um pequeno rebuliço e sussurros, todos se perguntando; “mas que merda é essa”? Um casal mais a frente começam a esbravejar.
- Meu amigo, este ônibus não passa na Cinelândia? – Gesticulavam muito, desvendando toda insatisfação, ambos tinham certeza de que este veículo passaria na Cinelândia. O caminho estava ficando cada vez mais confuso, e mais confuso ainda era o Motorista que disse.
- Eu passo na volta, não? – Perguntou a todos, ainda mais confuso. Se ele não sabe, como saberei? Confiantes de que o veículo passaria pela Cinelândia, o casal se calou, e continuamos a perambular pelas tortuosas ruas da Lapa, escapulindo pelas brechas sinuosas e estreitas. Paramos em um ponto ulterior, onde subiu um homem de idade avançada, com o rosto bem danificado pela falta de cuidados, sua pele parecia um saco plástico enrugado, carregava um carrinho de compras cheio de tralhas, sobretudo latinhas de cervas; trajava trapos pelos corpos, o fedor era incrível; numa das mãos carregava um copinho branco de plástico, provavelmente com pinga; Apesar da idade avançada e da pobreza latente, seu corpo era forte, os músculos sobressaíam em sua velha pele franzida, nisso ele diz, meio torto. – Pra onde vai isso aqui? – tomou mais um gole e, estrábico, jogou algumas moedas pro motorista.
- Acho que não sei, devo na volta passar na Cinelândia. – Houve sussurros. O veículo deu a partida e seguiu viagem. Não sabia dizer quem estava mais perdido naquele ônibus; os passageiros ou o Motorista, ou quem sabe este velho das latinhas. Um cara gordo que sentava ocupando toda uma poltrona de dois lugares levantou com dificuldade e caminhou até aporta esmagando aqueles que estavam de pé; risos e resmungos atirados como pedras ao obeso. O sinal foi dado para o veículo parar no ponto, porém não parou, seguiu a toda. Muitos passageiros que esperavam o ônibus no ponto vociferaram em todos os palavrões possíveis, o Gordão que queria descer também reclamou. O Motorista decide parar abruptamente jogando no chão alguns passageiros; risos, sussurros e reclamações. Muitos desceram. Alguns ainda permaneceram no ônibus, como o casal, o Senhor de camisa furada e puída, o catador de latinhas alcoólatra dentre outros gatos pingados. Chegamos num retorno no alto de uma rua, onde um caminhão de mudanças estava parado, seria impossível passar. Os dois Motoristas começaram a discutir. Não prestei mais atenção no que eles resmungavam; quem estava no direito de que, quem realmente seria o dono da rua.  Meu olhar sobre o mundo mudou num piscar de olhos; Fiquei olhando a rua; as casas construídas uma ao lado da outra, amparando e dando formato os lugares que habitamos; no mesmo espaço dividimos espaço com algumas marionetes vazias, com a falta de perspectiva; na rua um Mendigo aos trapos passava carregando um dicionário nas mãos. Carregava consigo um manto para o frio, roupas negras e marrons de sujeira, e nas mãos um dicionário. Junto com dois gringos o mendigo subiu no ônibus pela porta de trás, o Motorista Trocador não teve tempo nem de notar, já que discutia veemente com o Caminhão. O Mendigo não tinha uma das mãos, seu corpo era arqueado e parecia carregar problemas nas juntas. Não pude deixar de notar em seu olhar uma chama curiosa; a chama da vida, apesar de seu corpo aparentar fraco e desajeitado, seu olhar carregava a força de vinte homens. Nisso se sentou ao lado do Senhor catador de latinhas, consegui ouvir algo do tipo:
- Para onde você vai com estas latinhas? – perguntou o Dicionário.
- Vou vender por aí. – Respondeu a Latinha. – E Você, vai pára onde com este dicionário? – Argumentou de volta a Latinha.
- O dicionário é para eu não me perder, eles querem que a gente se perca por aí, mas não eu, jamais me perderei. Eles gostam de nos confundir, e com isso aqui – Disse apontando pro dicionário - eu chego a qualquer lugar. Eu já estudei gramática.
- Quem são eles?
- Somos todos nós. – Completou o Dicionário. – Se existir o espírito, eu tenho o espírito mais forte de todos os tempos, pois mesmo neste corpo aleijado eu ainda não fui quebrado, mas se houver só corpo e carne, eu já estou no inferno. - Olhei de volta e consegui ver tudo minuciosamente; todos os objetos decifrados em suas moléculas, tal qual um microscópio. Olhava minhas mãos em minúsculas bolinhas, que em sua forma cru, criava o seu contorno. O que poderia ser distante desta perspectiva? Se existe sempre algo além do minúsculo, o que poderia ser maior que o universo? Quando percebi, já estava em mais um ponto de ônibus e talhava a subir pedestres. Subitamente vejo o Senhor manco retornando do banco de passageiro de trás:
- Motorista, este ônibus não vai para Praça da Cruz Vermelha? – Interpelou meio trôpego. Com dificuldade balançou entre outros passageiros.  
- Você não ia para Rua México? – Completou o Motorista.
- Porra! Óbvio que não, acha que não sei pra onde estou indo? Puta que me pariu! Só me faltava esta, o Senhor é analfabeto das ruas? – Desembestou o Senhor Manco.
- Eu tenho o meu dicionário! – Riu o Mendigo. Que bafo.
- Será que este ônibus vai realmente passar na Cinelândia? – Entreolhou-se o casal na frente.
- Cara, é só você saltar aqui e ir andando reto pela Riachuelo, simples. – Arguiu o Motorista. Eu nem sabia mais para onde estava indo, talvez a Praça Mauá, mas do jeito que iam as coisas, dificilmente este ônibus passaria pela Praça. Paramos num sinal, algumas pessoas gritaram para abrir a porta de trás, porém o Motorista Trocador se recusou e gritou lá da frente que só abriria a porta no ponto. Houve reclamações, mas o Motorista estava certo, contudo abriu a porta e saiu em movimento com o veículo, irritando os passageiros:
- Porra! Vai tomar no cu, seu filho da puta! – Gritou alguém.
- O ventre da sua progenitora está infectado pelos germes da pútrida lança de um transeunte fecal. A porra do seu Pai é infecunda. – Gritou rindo o Mendigo do Dicionário, apenas por escárnio. O ônibus parou no ponto e as pessoas desceram contrariadas, muitas gritando com o Motorista.  A viagem seguiu. O ônibus trafegava com seus passageiros personagens. A rua ia se despedindo do seu aspecto antigo e dando uma face menos artística, os quadrados vão sobrepondo os detalhes, alternando modernidade e clássico, e parece que estamos cada vez mais perto do Centro. Um cara do meu lado comenta:
  - O que deu neste Motorista? Não sabe o itinerário? – Pareceu meio preocupado. Suspirei fundo e não disse nada. As pessoas olhavam incrédulas pelas janelas, simplesmente não parávamos mais em ponto nenhum. Todos gritavam histéricos pedindo pra pararem a porra do veículo, e de nada adiantava, seguíamos fortes, como numa pista de alta velocidade. Sacolejava muito, pois íamos ziguezagueando fugindo dos carros, outros carros e mais motos. O vento batia na cara, pessoas se agarravam nas cadeiras e nos corrimões. O motor rugia furioso na medida em que aumentava a tensão e a velocidade. Pedestres começaram a fugir desembestados nas ruas, desviam-se insanamente de um ônibus descontrolado no meio do Centro do Rio de Janeiro, enquanto eu só procurava saber o número do ônibus para jamais repetir esta burrice. Passageiros tentavam abrir a janela de emergência, uns discordaram e armaram uma briga dentro do ônibus. O casal queria abrir a janela, o Mendigo do Dicionário brigava tentando fechá-la. A mulher segurou na alavanca, e quando iria puxar, Mendigo a segurou pelo braço e tentou se explicar:
- A Senhorita não deve! Não pode! Iríamos todos perecer, cairíamos a fora do veículo, e num reflexo de segundos, seríamos atropelados e – Dizia cândido e meio confuso dos pés, tentando se equilibrar no veículo, contudo não conseguira terminar sua sentença. O Marido lhe empurra pra longe, fazendo com que os dois caiam rolando e sem controlo até a porta de saída do ônibus. Num inesperado segundo a porta se abre e ambos são cuspidos para fora do ônibus. O Marido é logo tragado para debaixo de outro ônibus e tem a cabeça esmagada pelas rodas. O cérebro e pedaços do crânio explodem pelas ruas trazendo desconcerto aos pedestres que ali passavam. Virei o rosto enojado e senti o nó clássico na garganta, quando tememos pela nossa vida. Uma lágrima desceria pelo meu rosto se o vento não a secasse antes. Olhei de novo para a porta de saída e vi o Mendigo pendurado, tentando com todas suas forças, tremendo, subir de novo no ônibus. Logo ele mostra os dentes num sarcasmo e se solta da porta. Seu corpo rola nas ruas e logo uma moto passa por cima de seu corpo. O Motoqueiro e o Mendigo rolam com a moto no chão. As tripas ficaram a mostra. O tráfego de carros aumentou e percebi que o sinal na frente estava vermelho, contudo não diminuíamos, na verdade aceleramos.   cangote do Motorista Trocador e tentou arrancá-lo do volante, ambos ficaram se estrangulando, puxando um ao outro, no mesmo tempo em que via os carros parados se aproximar.  Houve uma tremenda colisão; o saco de latas do Senhor Manco de Camisa Esburacada abriu e recheou o veículo de latas. Alguns passageiros foram lançados pra frente e colidiram a cabeça na poltrona. Pareceu um grande strike. Carros foram amassados como papel e lançados para frente com violência. O Passageiro de camisa Azul largou o Motorista Trocador e foi arremessado contra a porta de entrada do ônibus desgovernado. O Motorista caíra também para fora do volante, logo ele se recupera abrindo a porta de entrada, cuspindo mais um passageiro. Num ímpeto de caos e destruição, o Motorista Trocador atropela, em atos vis, todos os carros que param diante de sua fúria incontrolada. Seus olhos estavam arregalados numa gargalhada macabra. O ônibus tremia com brutalidade em cada choque bestial. Os gritos histéricos aumentavam o terror. Não sabia o que fazer, estava em torpor; A realidade nos surpreende com sua criatividade infinda. Num supetão uma passageira que segurava na poltrona é atirada pro corredor, sem agilidade alguma, ela virara refém do sacolejar do veículo, rolava para todos os lados do ônibus. Chorando ela esperneia e grita olhando para mim, querendo que eu segurasse em suas mãos, conseguia ver as lágrimas escorrendo pelo seu rosto. Senti-me fraco e sem forças, uma marionete teria mais vigor. Vi as mãos suadas fraquejarem, as minhas e as dela; não podia fazer nada, ela estava distante de mim, meus dedos afrouxaram; aquela pobre mulher não podia se segurar, pois era pesada demais. Não demorou muito e seu corpo voou porta a fora. Travei meus pés em baixo dos bancos de metal para sustentar meu corpo melhor, a cada tranco pensava que eu seria o próximo a sair pela porta. Mais um passageiro pulou no pescoço do Motorista Trocador, levando uma violenta cotovelada no nariz, o sangue espirra em gotículas no vidro. Atordoado o Passageiro dá dois passos para trás cambaleante. Seus olhos reviraram no mesmo tempo em que caiu inutilmente no chão. Seu corpo jorra inconsciente para debaixo de uma das poltronas. Abruptamente paramos. Meu corpo é arremessado pra frente, chego a bater o rosto na poltrona da frente. Um calor cortante desce em cores rubras na minha face. O silêncio contrasta o caos e o rastro de destruição deixado pelo ônibus. Os poucos restantes dos passageiros começam a olhar em volta, incrédulos, não fazendo a puta idéia do que realmente havia acontecido; alguns choravam descontrolados, soluçavam diante do fato de ter encarado a morte de tão perto. Olhei para minhas mãos, queria saber se havia perdido algum dedo no acidente; estavam todos lá. As lágrimas vieram sem soluços, não pelo susto, mas pelas mortes em que nada eu pude fazer. Era difícil de acreditar no que acontece. Talvez eu ainda estivesse em minha cama e tudo fora um pesadelo, ou uma piada de mau gosto, entretanto o gosto amargo do sangue em meus lábios me trouxe de volta a realidade. Fechei meus olhos tentando reaver meu alto controle e me senti feliz por estar vivo, ainda. O motor havia se calado, tudo parecia um breve silêncio. Uma multidão fora do ônibus observava tudo num reality show. Tonto vendo tudo em flashes, tropeço numa pessoa, caio de cara. De repente alguém puxa meu braço me erguendo. Era um policial com uma roupa estranha. Começou a me carregar pelo braço, outros passageiros também são socorridos. Antes de sair, vejo o Motorista Trocador de cara no volante com um buraco na testa, os miolos esparramados e um pouco dele no que sobrou do vidro da frente. Não tenho tempo para pensar, vou caminhando arrastando os passos numa pressa contínua. Um helicóptero sobrevoava o local em vôos rasantes. Sinto saudades de amores que nunca mais vi, nem tive breves noticias. Queria poder tocá-las mais uma vez, mas estão mortas, sumidas no mundo. Arrependi-me de não ter feito coisas, do medo do ridículo; e pela primeira vez na vida comecei a encarar o mundo de forma estranha, nunca tinha percebido que a vida me pertence, que apesar de ser um ser social, vivo para mim e meus prazeres, e desde que não interfira na vida alheia, posso fazer o que quiser; posso escolher meu rumo e meu aprumo. Caminhava atônito entre o caos. Ainda sendo carregado olhei para o ônibus em chamas, estava tão aturdido que não havia percebido que ele começara a pegar fogo. Os bombeiros foram depressa apagar as chamas, temendo alguma explosão cinematográfica. Nunca mais seria o mesmo, uma parte de mim havia morrido no ônibus, junto com aquelas pessoas que não tiveram a mesma sorte que nós sobreviventes. Chorei por eles e por mim. Uma paramédica veio em meu socorro olhar meus ferimentos, e sem pensar duas vezes, abracei-a forte em meus braços num soluço sem fim; chorei toda minha confusão.               


domingo, fevereiro 28, 2010

Prefácio.









O tempo é uma certeza de vida, tanto quanto o de morte; e a vida é o que você leva pra eternidade, você querendo ou não. No momento em que ela se extingue, o que você leva, é o seu ultimo segundo. Então cuide deste último segundo. 

terça-feira, fevereiro 23, 2010

Boca Rasgada.




Não faz tanto tempo assim,
Em que o tempo me deixou sem lembranças.
Eu mantenho meus braços fortes
Sustentando as feridas,
Para que o sangue pulse,
Sem saber para onde jorrar.
Sinto que pensar fará deslembrar cada vez mais.
Nas madrugadas de insônia
Tentarei correr sem pernas,
E sem pulso viajarei num mundo sem janelas,
Em diversas cores perdido no preto e branco.
Meu corpo se meche conforme o silêncio,
Deixastes minha boca costurada, e confusa.
Em fios de nylon visíveis e manchados de sangue,
Minha curta vida alongou-se no tempo.
Eu posso ver um passado inédito nas minhas veias poluídas,
Feito de quimeras e fantasias obscuras,
Corruptas pelos mesmos vícios daqueles que se autodestroem em todas as dimensões,
Sem ver o caos deixado pra trás.
Mesmo assim lhe vejo no reflexo do meu retrovisor,
Correndo sem pernas,
Sem pulso para me acompanhar.
O fim veio só de um olhar,
Sem gelo e com o calor da tristeza.
Queimei minha pele selado num beijo,
A saliva secou e se transformou numa gota de lágrima,
Salgada como o mar e perdido em sua imensidão de dimensões azuis.
A boca costurada rasgou as entranhas da linguagem,
Tornando o beijo repulsivo,
E dançando em silêncio no preto e branco,
ausente de qualquer pulsar,
viajo num mundo onde as janelas não se fecham,
pois elas não existem,
e onde a porta eu nunca cheguei a ver.  

Lobato Dumond. 

quarta-feira, fevereiro 10, 2010

Big Bang.




Cheguei ao metrô. A camisa parecia mais um pano de chão de tanto suor, o calor era suportável, insuportável era ficar de camisa e calça. Os índios tinham razão, esta terra é mãe dos pelados. O metrô estava cheio, pessoas derretiam os restos de sanidade com a fisionomia do desespero. Um urso polar deve estar agonizando em algum lugar deste planeta infernal. Os minutos se arrastam na espera do metrô, o tempo parece não passar nunca; um velório seria mais rápido. O metrô chegou estrondando em seus sons metálicos espalhafatosos. À medida que ia parando os vagões, percebi que havia carros com as luzes apagadas, e outros com luzes “meia bomba”. As pessoas fizeram um tumulto correndo em direção as portas, o que me fez lembrar o Haiti; não é aqui. Para fugir do tumulto insano, parei em frente ao vagão onde tinha menos gente, apenas algumas pobres almas, o curioso é que a maioria lá dentro estava cabisbaixa e os homens sem camisa. A porta automática abriu. Imediatamente um bafo insuportável me tragou e, com medo de perder o metrô, entrei contrariado com mais duas pessoas. Era uma sauna lá dentro, todos se abanavam e sopravam os braços para não morrer de calor, sim, morrer de calor. Pensei que alguém poderia desmaiar a qualquer segundo lá dentro. Logo que entrei algumas gotas já saltaram de minha testa e pingaram do meu rosto, olhava os pingos de suor e via-os evaporarem antes de tocarem o solo. O calor consumia minha respiração ofegante, ao mesmo tempo em que meus pés me traíam cambaleantes. Respirava fundo um ar que não existia, as outras pessoas do vagão estavam prostradas nos assentos. Olhares vazios procuravam um copo d’água. Pensei em sair, mas não houve tempo, as portas fecharam logo atrás de mim, pensei em desmaiar, todavia meu corpo agüentou bem. Não sei como aquele Senhor ao meu lado estava agüentando o insuportável calor, mas nisso ele puxa assunto:
- O governo só vai comprar mais vagões em 2011, até lá vamos viver neste inferno. – Seus olhos eram cansados, porém bastante atentos e vivos. O hálito fedia a macarrão, me afastei um pouco. – Não sei o que aconteceu. Como deixaram circular um vagão sem ar condicionado, é impossível ficar aqui dentro. Também não sei como estas pessoas daqui não foram para outro vagão, deveriam se mobilizar. – Completou com um olhar jubiloso. Não entendi aquele olhar de prazer ao falar, estava totalmente fora de contexto. Continuou. – Justamente o que digo. Tirem estas suas patas deprimidas do solo, usem-na para alguma coisa; enquanto houver o céu, há de vir nuvens nos abençoar. – Seus olhos inflamaram na palavra abençoar. No tempo que traduzia seus pensamentos conturbados, o suor aumentava em cada milímetro percorrido. As pessoas iam demonstrando fraqueza, cabeças baixas e braços pesados. O trem pára. Rapidamente as pessoas migram para outro vagão, enquanto novos e diferentes desavisados entravam no vagão escangalhado, e mais uma vez me vi diante da face brasileira; cansada e abatida pelo calor da incompetência. Entrei no vagão, ainda sentindo o calor, mas o alívio logo dominou meus sentidos. Não estava tão gelado como deveria estar. O tumulto dos desesperados causava um bafo, mesmo no ar condicionado. Fiquei em pé exprimido ao lado de uma gorda fedorenta. Seu traseiro ocupava qualquer espaço livre. O ar ficou pesado com a lotação. O Metrô se tornara um matadouro cruel, uma lata de sardinha deveria ser mais confortável. Logo a gorda decide se expressar; em face desdenhosa e altiva. 
- Em breve a estação do Botafogo vai se tornar de passagem para outras proximidades, que nem a Estácio. – Todos se entreolharam. Não entendendo o que se passava, logo sou surpreendido por uma voz ao meu lado.
- O governo só vai comprar mais vagões em 2011, até lá vamos viver neste inferno. – O bafo de macarrão voltou impregnando o ar. Saí de perto. Não queria ouvir a mesma ladainha. Empurrei as pessoas querendo ficar distante daquele cara bafão. Abruptamente o trem começa a frear. Alguém puxou o freio de emergência, de certo. As pessoas se exprimem ainda mais, mesmo com o ar ligado, o suor começa a umedecer meus poros. Pescoços e olhares procuram respostas no meio do vagão. O murmúrio começa a lotar o ambiente num som de ondas colidindo com pedras. Num inesperado acontecimento, um homem de olhar pacato se levanta no meio da multidão. O calor aperta, sinto como se o Cristo Redentor não abrisse mais seus braços sobre a cidade, e sim carrega um tridente no meio deste inferno. O homem de olhar pacato olha para o lado avistando uma mulher de roupas ortodoxas, esta lhe retribui o olhar com um aceno de cabeça. Aproximo-me das portas empurrando as pessoas, aquilo não estava me cheirando bem, e não parecia um peido. Fiquei receoso ao lado da porta, ambos tinham um olhar insano, cheio de certezas e dogmas, sim, o olhar era impetuoso e, sem deixar de colar todas minhas costas na porta do vagão, num sorriso amarelo, com os dentes bem trincados, o homem de olhar pacato começa a discursar:
- Meus irmãos aqui presentes.
-... E minhas irmãs... – interrompeu a Mulher de Roupas Ortodoxas.
- Nós fazemos parte de um grupo em recuperação, pertencente à assembleia de Deus. – Voltou a resmungar o homem. Estranho, sua voz realmente carrancuda, como sua face escrota. – Estamos aqui em busca de um pouco de atenção ($). Eu tive uma visão. – Completou.
-... Ele teve uma visão. – interrompeu novamente a Mulher Ortodoxa. 
- E nesta visão o Homem tinha encontrado a paz. – Coçou o braço freneticamente, como se quisesse provocar uma ferida no próprio braço. 
-... O ser humano ele quis dizer... – A Ortodoxa entrecortou o Pacato. Não gostava muito do rumo daquela porra de conversa, estava me deixando nervoso. Comecei a forçar a porta do metrô para sair dali na marra. Nada de movimentos, todos olhavam passivos sem saber o que fazer, se ouvia ou metralhavam aqueles loucos de porrada. 
- E vejam como já dizia o versículo um de coríntios, “Graça e paz da parte de Deus nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo”.
- Sim, nosso Senhor Jesus Cristo. – repetiu a Irritante Ortodoxa. Sua voz, para completar sua figura horripilante, soava estridente e fanhosa. Trajava uma saia que arrastava no chão e toda de preto, não parecia estar vestida como freira, estava mais pra viúva. As freiras são as viúvas de nosso Senhor Jesus Cristo? Perguntei a mim mesmo. Não soube tal resposta e me calei, no mesmo tempo em que cedia a porta do vagão. Alguns passageiros olharam, notando a porta se abrindo. Intrigados e curiosos permaneciam olhando o nosso pacato guerreiro de Deus. 
- Nosso Pai está entre nós, algumas pessoas já sabem disso, - Continuava Pacato. – Outros, porém, esqueceram de sua força e de sua superioridade entre os Homens... – Seus olhos pediam alguma coisa na medida do correr de seu discurso. 
- Do ser humano você quis dizer. – Interrompia novamente a Ortodoxa Viúva. 
- Nós – Prosseguiu Pacato. – já percebemos sua força e largamos as drogas, vencemos pela raiz, fora extirpada de nossos poros, pelos delírios notívagos de um lagarto louco, o sol lançou seu poder sobre a terra e se fez a vida, graças ao nosso Senhor Jesus Cristo.
- Viva a Mãe de Deus! – Vociferou Ortodoxa. Mas de que diabos estes loucos estão falando?
-... Convocastes como para uma festa a multidão de terrores. No dia do furor divino ninguém fugiu, nenhum escapou. E aqueles que criei e eduquei meu inimigo os exterminou! – Pacato estava cada vez mais empolgado em seu discurso. - Levanta-te à noite; grita ao início de cada vigília; que se derrame teu coração ante a face do Senhor. Ergue para ele as mãos, pela vida de teus filhos que caem de inanição, em todos os cantos das ruas. – Não entendia muito que queria dizer aquelas merdas, mas os passageiros estavam já impacientes, alguns até assustados com tamanha loucura. - Abrem a boca contra ti todos os teus inimigos. Escarnecem e rangem os dentes. Nós destruímos, dizem eles, eis o dia esperado, estamos nele, estamos vendo! -Terminei de abrir a porta, mas estavam todos compenetrados demais no show. - Ei-lo que vem com as nuvens. Todos os olhos o verão, mesmo aqueles que o traspassaram. Por sua causa, hão de lamentarem-se todas as raças da terra. Sim. Amém. – Pacato seguia em sua apresentação fantasmagórica, por assim dizer, gesticulava muito e sua fisionomia sofria uma pequena transformação em cada palavra. 
- Amém. – Repetiu Ortodoxa. 
- Amém. - Alguns gatos pingados ecoaram em coro. Não estava gostando muito daquela lavagem cerebral coletiva, só sei que me precipitei e coloquei uma perna para fora do vagão, estava pronto para sair dali.
- Ei-lo que vem com as nuvens. Todos os olhos o verão, mesmo aqueles que o traspassaram. Por sua causa, hão de lamentar-se todas as raças da terra. Sim. Amém. Eu sou o Alfa e o Ômega, diz o Senhor Deus, aquele que é, que era e que vem, o Dominador. Ao vê-lo, caí como morto aos seus pés. Ele, porém, pôs sobre mim sua mão direita e disse: Não temas! Eu sou o Primeiro e o Último, e o que vive. Pois estive morto, e eis-me de novo vivo pelos séculos dos séculos; tenho as chaves da morte e da região dos mortos. Lembra-te de como recebeste e ouviste a doutrina. Observa-a e arrepende-te. Se não vigiares, virei a ti como um ladrão, e não saberás a que horas te surpreenderei.
São Mateus 16,16. Simão Pedro respondeu: Tu és o Cristo, o Filho de Deus vivo! – Aquela merda estava me matando de tédio, quando num súbito movimento os dois servos de Jesus abrem suas casacas, enquanto a mulher abre sua saia, mostrando uma perna bem torneada, ambos lotados de explosivos pelo corpo, e Pacato ainda puxa uma granada. - Se uma mulher se aproximar de um animal para se prostituir com ele, será morta juntamente com o animal. Serão mortos, e levarão a sua iniqüidade. Estamos no juízo final A morte e a peste hão de reinar, se é que já não reinam. – Não fico ali esperando a merda toda detonar na minha cara. Corro porta a fora e mexo minhas pernas numa velocidade que as fazem doer. Maldito fanatismo, sinto-me em Israel, na faixa de gaza, ou num dia de cão na Rocinha. Corro na direção em que seguia o Metrô. Devíamos estar perto da próxima parada. Corro como nunca corri em toda minha vida. A respiração aperta meus pulmões, o ar parece não ser o suficiente, ao passo que meu coração acelera num frenesi absurdo, penso que dentre de instantes posso, a qualquer minuto, cuspir meu coração; corro; corro; corro; corro; respiro; no desespero corro ainda mais. O túnel é quase um breu por completo, corro sem olhar para trás. Percebo que alguns passos também me acompanham, logo atrás de mim. Não preciso saber quem é. Apenas corro; corro; corro. Consigo ouvir de longe o som de um tumulto no trem onde estava, muita confusão, murmúrios; gritaria; caos; desordem; ecos. O clarão de repente se aproxima após uma curva. A luz. Finalmente entendi a luz no fim do túnel. Subo correndo tentando não tocar nos trilhos. Começo a gritar que há loucos no Metrô. Muitos me olham sem entender porra nenhuma. Outro grupo que corria atrás de mim, sobe igualmente na plataforma. Um cara estabanado morre eletrocutado ao tentar escalar a estação. A faísca assusta os demais pedestres, e a correria toma conta do lugar; uns se distanciam; os curiosos se tumultuam para ver o corpo. O cheiro de carne queimada fede o local, igual um incenso. Eu não quero nem saber, continuo correndo, queria me ver longe dali. Respiro tentando arfar todo o ar que tenho direito. Logo alguém grita:
- Esta porra toda vai explodir. – Muitos não sabem o que fazer. As pessoas estavam aturdidas, perdidas em seu terror, não esperavam que um dia, num pacato dia, o mundo realmente poderia acabar. Não o mundo todo, porém o mundo de algumas pessoas. Comecei atropelar todos que transpusessem meu caminho. De súbito tudo começou a tremer num relâmpago ao longe, o estrondo fora ensurdecedor. Pequenos pedaços de concreto começaram a cair. Um Senhor tem o crânio esmagado, bem na minha frente. Não tive muito tempo para me estarrecer. Gritos ecoaram e choros logo começaram a tanger o quadro do terror. O fogo chega lambendo e matando algumas pessoas que olhavam o corpo do eletrocutado estabanado. Atropelava pessoas desmedidamente. Empurrava-os de contra o chão com toda minha força bruta. Homens e mulheres se puxavam tentando se salvar diante o terror. Cheguei na superfície e vi um daqueles tumultos homéricos; Policiais tentavam conter a população em estado de choque; carros de todas as emissoras de TV já cobriam todo o acontecimento ao vivo; Civis ainda subiam pelas escadas com feridos a tira colo, muitos sangrando ou aterrorizados; correr era o que mais se via; parar para ver, era o que mais se fazia; Diante tudo aquilo, não pude deixar de pensar:
- Aquelas pessoas, realmente, sabiam acordar Deus. 


sábado, janeiro 30, 2010

Máscara.

 


O sentido das coisas diz que vou morrer.
Minha pele definha conforme o sol a queima,
Assim como a dor do abandono se torna audível
Em todos os silêncios da manhã.
Alguém lhe estende a mão no escuro,
Tentando salvar o que um dia foi,
E mesmo o que um dia será,
O conforto de um sentimento qualquer.
E sempre que eu acordar,
Não verei mais o meu rosto,
Tão pouco a máscara de porcelana que construí
com zelo para lhe encontrar,
o reflexo trará a verdade;
o passado que não vivi no mundo de plástico,
camuflado num parque de diversões.
A razão se tornará débil e relutante,
Renascendo em cada loucura a minha paixão errante.
O tempo não será mais o tempo,
Nem mesmo a areia do seu relógio,
Ele não será.
Falar não adianta,
Eu quero mais, muito mais, muito.
E volto a perder os sentidos das palavras
Afogando a saliva nas lágrimas.
Eu preciso de qualquer coisa que me faça lembrar quem eu fui.
Quero ser novamente pra poder me perder.
Andar vagando e sem rumo,
A esmo na cidade de borracha,
Nas palavras imperecíveis,
No amor que não se consome,
Mas que arde e perfuma no fogo.
O Amor teima,
O que resta é saudade.
É só nela que a encontro, todos os dias.
Fortalecendo a coragem,
Aquela máscara ficará aprisionada nas imagens da mentira,
E do que se perdeu.

Lobato Dumond.

terça-feira, janeiro 26, 2010

Naco De Carne.






Senti a areia nos pés transpassando pelos meus dedos, dando uma desconfortável sensação. A sola começou a queimar. Desconsideir um pouco esta informação no meu cérebro, foi um tanto difícil , mas andava camuflando a dor. Logo se aproxima um destes caras de alguma barraca de praia.
- Vai querer cadeira maninho, temos aqui...? - Logo interrompi apontando a cadeira que carregava em uma das mãos. - E uma barraca, posso conseguir uma barraca, e...? - O cara não desistia. Saí correndo para próximo d'água, queria me livrar daquele mala. Observei bem e procurei algum lugar onde não me incomodariam. A praia estava num daqueles dias; Não se acharia nem o Osama Bin com seu turbante e ostentando aquela barba escrota. O sol aumentava ainda mais a força de seu maçarico, a pele tostava, chegando a arder e brilhar. Arrumei minha cadeira e sentei olhando ao redor; muitos corpos torneados, expostos e no mercado visual da carne; chã, patinho ou lagarto; claro que com alguns filés aos olhos; contra filé, mingnon. Não demorou muito, avistei uma antiga amiga minha, nunca havia visto ela na praia, na verdade nunca havia visto ela de biquine, logo me animei, finalmente mataria minha curiosidade. De calça ela era bem vistosa, principalmente a bunda, engraçado é que ela apenas andava de calça jeans. Ajeite-me na cadeira pronto para saborear mais uma naco de carne, apertei a vista para me concentrar melhor, coloquei meu óculos escuro, e fechei a boca para não chamar a atenção. Logo que chegou, esticou uma canga na areia e colocou sua mochila em cima, procurou algum rosto conhecido, não achando nada, fez um montinho para segurar sua bicicleta. Ela estava meio perdida de início, não sabendo muito o que fazer, parecia nova no pedaço, entretanto todo homem sabe que a mulher tem um sezto sentido e sabe quando está sendo observada, tudo não passava de charme, para mim, ou mais alguém que ali olhasse. Virei o pescoço para a direção oposta dela, fingindo procurar outra coisa que não fosse sua bunda, mas meu olhar não saía de sua traseira. O jeans parecia comprimir bem, dava a impressão de uma bunda bem delineada. Virava e desvirava o pescoço. Ela fazia charme e se movimentava lentamente. Ameaçou tirar o short jeans desabotoando seus botões, contudo logo parou e ficou a olhar o mar. Aquele suspense todo estava me incomodando, logo desistiria de esperar e levantaria indo lá fazer um choque de ordem. Num único movimento ela arreia as calças até o joelho e logo tudo se transforma em uma doce e abundante carne gorda de... Justamente na hora que tudo se revelaria, uma mulher quadrada e desproporcionalmente gigante entra na minha frente tampando a visão. Aquilo me deixa um pouco transtornado, aguardei tanto pelo momento e, na hora, entra esta pessoa. Tento esquivar o pescoço o esticando para o lado, fica até meio na cara e ridículo, algumas pessoas me olham desconfiadas. Finjo matar um mosquito no meu pescoço. Sorrio. Não olho para ninguém, um jornal voava pela areia, quando coincidentemente ele choca contra minha perna, pego-o e começo a ler. De repente grito: sai da frente, bola!- As pessoas me olham intrigadas e curiosas. Olho pruma galera que jogava altinha, escamoteando minhas verdadeiras ações. Dado alguns minutos, levanto-me e caminho em direção ao mar, e logo tudo se ransforma em uma doce e abundante naco de carne, não era á toa que que esta menina só usava jeans. Não sei nem como aquele traseiro cabia no jeans, era muita coisa. Seu pequeno biquini sumia entre as buchechas daquele rabo gordo. É incrível o que as roupas conseguem esconder. Confuso fui esfriar minhas idéias com Iemanjá. Como seria Iemanjá por debaixo daquela saia...?

quarta-feira, janeiro 20, 2010

De Testa No Vidro.



Um dia depois do outro. É assim que tento levar a vida, entretanto me atropelo e acabo levando todos os disa de uma vez só. Não consigo me enxergar no meio deste turbilhão de ações e demências. O que poderíamos fazer para colocar uma âncora no mundo? Um freio que seja, para podermos navegar mais calmos, com objetivos definidos e propensos ao sucesso da calmaria. Nada é definido, nada é certo, nada é nadar no rio frio e não ter toalha que lhe seque. Pensava de bobeira no ônibus, sem er muito pra onde fugir com as idéias. Adormeci colando a cabeça no vidro da janela do ônibus em movimento, sentia meu crânio quicando e trincando no vidro. De repente senti um mão no meu ombro. Um policial me acordava e pedia para eu me levantar. Começou a me revistar, vasculhou toda minha mochila em busca de alguma merda que me encriminasse, por sorte eu havia deixado minha maconha em casa. Havia quatro policiais circulando pelo transporte público revistando e vasculhando todos os trabalhadors ali prsente. Muitos ali com cara de cu. Não entendiam porra nenhuma, parecia que haviam acabado de acordar como eu, msa na verdade ninguém acordou, estamos todos dormindo com a cabeça colada no vidro; um sono ruim, o corpo não relaxa e o som da cabeça trincando no vidro se confunde com o barulho do motor. Enquanto o policial revisava outro malandro no banco da frente, minhsa mãos começaram a suar e tremelicar. Minha fisionomia mudou repentinamente. O frio secou os meus lábios, pulei no coldre do filha da puta e saquei sua arma; uma 9mm com um puta coice. Atirei no filha da puta na minha frente. Osangue espirrou no meu rosto e jorrou nos outros passageiros. Senti uma bala transpassando minha coluna e estrpando minha espinha. De repente senti um mão no meu ombro. Um policial me acordava e pedia para eu me levantar. Começou a me revistar, vasculhou toda minha mochila em busca de alguma merda que me encriminasse, por sorte eu havia deixado minha maconha em casa. Estava meio tonto, ainda. Não encontrando nada n oõnibus, nem um marginal que fosse, o transporte público seguiu seu caminho e eu reencostei minha cabeça no vidro e voltei a adormecer.

Lobato Dumond.

Sempre Assim.




Que sol absurdo. Minha testa pingava aos prantos por um copo d’água, a camisa parecia um pano de chão, enquanto caminhava em direção ao Banco do Brasil. Incrível como o sol pode castigar uma condição física, não suportava dar um passo sequer, no entanto continuava caminhando, em passos curtos e pesados; um deserto não seria tão quente. Entrei no banco da agência próxima ao Largo do Machado, o contraste do clima me levou ao gozo; uma enxurrada de gelo causado pelo ar condicionado acalmou minhas súplicas, nunca senti tanto alívio. Precisava fazer um depósito de pequena quantia, não precisava ir até o caixa, decidi ir ao caixa rápido mesmo, acontece que havia um papel em cima do monitor, avisando que a máquina estava emperrada, comecei a caminhar em direção a outra máquina, quando um funcionário me chama a atenção:
- Senhor. Este caixa rápido não está funcionando, todos os depósitos devem ser feitos no caixa. – incrivelmente o funcionário trajava terno e gravata. Muitos nas ruas trajavam terno e gravata; outros usavam calças e mangas compridas, isso num clima de matar qualquer idoso de calor; os índios estavam certos, isso aqui é país para se andar nu, enquanto isso, gastamos e desperdiçamos milhões em energia. Caminhei a contragosto para o caixa. Logo na porta giratória sou barrado, uma voz metálica indica que há algo metálico comigo. Despejo tudo que tenho nos bolsos dentro de um compartimento na própria porta; quatro chaves com três chaveiros, um celular, outro celular, e só. O guarda observou bem e me liberou. Entrei numa fila absurda. Dois funcionários atendiam nos caixas.
- Hoje as máquinas não funcionam, ontem faltavam envelopes para depósitos, semana passada faltou energia. – Disse uma mulher de óculos e cara de intelectualóide na fila. Tinha beiços avantajados, imaginei como seria um boquete; machismos a parte, deveria ser muito bom, apesar de ser meio estrábica.
- Sempre tem um problema nestes bancos. – completou um cara na minha frente. – Nunca tem funcionários o suficiente para atender as pessoas nos caixas.
- Não é a toa que é o Banco do Brasil. - interrompi. Todos gargalharam. O Banco do Brasil não é uma instituição financeira que resguarda e zela pelo dinheiro do povo brasileiro. O Banco do Brasil é um banco, um assento, uma cadeira de uma praça onde todos sentam e esperam, e nada acontece. Nisso um dos funcionários passa reclamando que o valor no seu contra xeque veio errado, estava faltando alguns reais. Achei melhor não comentar, havia pessoas armadas no recinto. A maioria das pessoas na fila estava depositando. As horas correm depressa numa fila, o saco incha e as pernas criam varizes em meados de segundos. Quando você olha no relógio, já se passaram quarenta minutos. Fiz o que tinha de fazer com cara de cu, não sei se a menina do caixa tinha alguma coisa a ver com a demora, mas de sete caixas do banco, apenas uma funcionava. O Banco do Brasil; o nosso banco, a nossa praça.

Lobato Dumond.

Leve Corpo.



Não sei se ficou, ou se vou.
Apenas sei que ando,
contemplando tudo que me transtorna,
deixando um breve sorriso em cada lágrima.
Penso na terra que há de devorar,
não só tudo aquilo que amei,
mas junto meu coração.
Embriagado.
A lucidez se tornará uma lembrança
Infinda,
assim como todas as estrelas,
tornando-se uma constelação de memórias,
sem sentido de tão longe,
brilhante e reluzente se olhares de perto.

Lobato Dumond.

Prisioneiro Das Histórias.




Num faz muito tempo em que ascendi um charuto. Tento esquecer os tropeços e angústias que me empurram neste tempo louco e maldito. O mundo corre e corre e eu não saio do lugar; máquinas de dinheiro e maquinárias de capital. Pra onde vai o mundo eu não sei, a única coisa que me conforta é estar aqui com meu Coiba, preso em minha opinião singela e livre da política do mundo, entretanto o mundo não está livre de mim, não por enquanto. Carrego o fardo do esquecimento, as pessoas esqueceram que eu existo, ou esqueci-me de interagir com o mundo, não me integrei, estou no embargo político de sempre. Não me falta nada, e ao mesmo tempo me falta tudo. O que me preenche de um lado me consome aos poucos pelas bordas do outro. Tentei nadar uma vez pra longe, contudo os tubarões comeram a minha perna, sobrou ficar de pau duro, até minha carne acabar, junto com me sangue. Quando ainda era jovem e embriagado, (tive de largar o álcool, haja fígado) não me faltava boceta, o perfume delas impregnavam na minha pele e eu vivia num laboratório por ai, tudo era experiência. A razão de ser do sexo me deixou insano, restava-me dançar. Eu servi uma vez meu país, quando eu tentei fugir dele, nadando. Mas perdi minha perna prum tubarão. Eu já contei isso? Não importa. Já percorri todas as cidades desta bendita ilha. Já contei como lutei ao lado de Che? Foi à maior aventura de todas. Foi num tempo onde a ideologia ainda ditava alguma coisa, dizem que a ideologia não dita nada, apenas é democrática, mas a ditadura da ideologia é bem interessante, as idéias assustam os ignorantes, nem os gênios as sustentam. Mas eu estive ao lado de Che e Fidel. Já vi de perto a liberdade, já lutei por ela e já dei minha vida a ela por ela. O que aconteceu com a ideologia? Não sei. Hoje eu torço apenas, torço pro baseball e pros jogos olímpicos, nada mais sobrou. Vislumbro alguma política onde possamos transitar por aí, sem ter de se sentir oprimido apenas por ser. O Che foi uma grande pessoa realmente, dizem que ele era assassino, mas quem na guerra não o é? Eu mesmo atirei em alguns filhos da puta. Não. Não conseguiria atirar em alguém hoje em dia, são outros tempos, não existe mais a ideologia, ela virou um baseball. Talvez se houvesse um levante em nome do baseball, mas seria só isso. Já contei como perdi a perna prum tubarão?

Lobato Dumond.

terça-feira, janeiro 12, 2010

Tempo Consumido.






Eu quero ser
Eu quero ser
Quero corromper
Crescer e inverter
Eu quero ser

Meu corpo é um templo
Escuso
Escuro
Meu corpo é o tempo
Curto
De consumo

Eu quero ser
Eu quero ser
Quero escrever
Quero morrer
Sem perder

Ser sem ser visto
Ser sem ser comprado
Minha vida é o ódio
E as cinzas do pó
Que eu havia cheirado

Eu quero ser
Eu quero ser
Quero corromper
Crescer e inverter
Eu quero ser
Lobato Dumond.