segunda-feira, abril 14, 2008

Diálogos Escatológicos Malditos.




Entrei em casa numa pressa sem controle. O suor começava a escorrer pela têmpora, minhas mãos também carregavam os indícios de um estômago atropelado por merda; apertava firme o punho, fazendo todos os movimentos estabanados. A porta bateu com enorme força, o estrondo ecoou por alguns andares no edifício. Vou direto pro banheiro, arreio a calça e meto um quilo de bosta pra fora. O alívio me toma de imediato, refletindo num leve sorriso. Pego um jornal que já estava no chão a minha frente, não era do dia, mas servia pra passar o tempo. Sentia o cocô saindo espremido entre minha bunda. O odor ainda não incomodava, pois o traseiro tampava a saída da fetidez. O tempo não demorou muito a passar, as notícias cotidianas do caos urbano inflamaram a merda toda; alianças políticas; desgaste político; verbas mal aplicadas; desvio de capital; assassinatos; tráficos; chega. Levantei e para minha infelicidade, constatai que o papel higiênico havia acabado. Isso não podia estar acontecendo agora, estava atrasado pro trabalho, o tempo comia meus neurônios, aliado ao estresse de ter que pensar em cada minuto como tempo perdido de vida, e eu amaldiçoava meu corpo fétido. Os troços boiavam n’água e, no segundo em que me levantei, o perfume já dominava tudo em volta. Não, eu não estava morto, ainda não. Sai casa a fora procurando algo que eu pudesse me limpar. Andava em passos curtos ao redor do apartamento. A bermuda arriada prendia um pouco minhas pernas, fazendo-me andar de forma engraçada. Fui à dispensa e o papel higiênico realmente acabara. Estava literalmente na merda. Sentia os pedaços restantes entre as bandas, incomodava esta sensação. Tinha que inovar. Fui ver se tinha guardanapo; nada também. Os papéis que havia na casa iriam machucar meu rabo. Amassei um bocado de jornal no intuito de deixá-lo mais suave. Limpei-me e senti incomodado ainda. Não houve alternativa se não tomar banho. Merda.

domingo, abril 06, 2008

A Arte Das Artes.






Muitos vêem a arte,
Como a manifestação de Deus nas mãos do homem.
Alguns ainda insistem,
De vê-la como mistério da alma humana
Outros a deterioram como produto,
Onde sua equação sempre terá o mesmo resultado.
Entretanto, a arte é muito maior que isso tudo adjacente.
E infinitamente mais.
Cúmplices,
Bem vindo ao Exorcismo.

terça-feira, abril 01, 2008

II - Vira-Lata.









Abriu espaço no meio do tumulto e correu em direção ao prédio. Chegando às proximidades do condomínio, resolveu não subir pro apartamento, estava com medo do que iria encontrar lá. Mal sabia ele que nada encontraria, porém, até o nada se torna assustador, principalmente quando se existe a busca pelo todo. Continuou correndo em direção a lugar algum, enquanto os solilóquios martelavam infindáveis redemoinhos, oscilando entre as possibilidades reais e virtuais que poderiam lhe preencher de novo a sanidade. Tropeçou em suas aflições e caiu de joelhos, sustentados pelos punhos. Suas mãos ficaram raladas, enquanto um dos joelhos sangrava pela nesga de pano rasgado da calça de linho. Logo se levantou e voltou a correr, as pessoas o fitavam assustadas, contudo as fisionomias que o julgavam, não chegavam a um terço de sua face desesperada. O pulmão já ofegava desilusões de oxigênio, as pernas se derretiam no ardor de seu sangue e, num colapso aterrorizado dos braços frenéticos, os músculos urraram de dor e ardência. Então, decidiu correr mais e mais, num ódio crescente pelo cansaço. Passando pelas ruas em passos largos e velozes, tentava encontrar algum lugar em sua mente que fosse seguro, em que pudesse parar e se reencontrar. Tornava-se algo em vão tais pensamentos. O cansaço aliado ao desespero não deixariam nem os mais sensatos da humanidade raciocinar em soluções. A única solução era correr a esmo, sendo assim, era o que ele fazia; correr; correr; correr; tropeçar; equilíbrio; correr; ultrapassar; seguir; pular; transpirar; suar; correr; percorrer; ver viajar; cruzar; cortar; trombar; derrubar; continuar; observar; despertar; advertir; cambalear; dor; perseguir; fugir; esquecer; sumir; perder; voar; sobrevoar; imaginar; sonhar; fantasiar; perder-se; percorrer-se; perder-se; correr; correr; correr; imaginar. Ao trombar com uma senhora carregando um cachorro no colo, ambos contorçam-se no ar e caem feito jaca podre. Alguns mais prestativos prontificam-se para ajudar a dona se levantar. Nosso protagonista já fazia a curva na esquina seguinte, quando começam a procurar o responsável por aquele reboliço todo. Nada parecia deter este corpo em movimento, em determinadas situações, o corpo humano pode ser um tanque imbatível, passando por cima de qualquer outro corpo. O tempo parecia correr junto com este homem. Determinado momento suas pernas não agüentaram mais e ruíram num estrépito seco. Resfolegando a dor de um cansaço descomunal, suas mãos agora tremulavam apertando as areias do Arpoador. Experimentou o corpo fenecer por entre a areia, parecia afundar na areia movediça. Soterrado pelo peso dos grãos, sacudia-se com enorme terror. O resto de energia que sobrara em seu cadáver, fora usado por estes últimos movimentos ébrios. As trevas dominaram seus sentidos num último suspiro de naufrágio.
Logo se viu caminhando trôpego pelas ruas tumultuadas do Centro da cidade. Não sabe como chegara ali e, sem saber, nem pra onde se dirigia, abraçou seus passos com as pernas com grande velocidade. Vestia-se bem; terno de boa costura, gravata de cor branda, uma camisa social de linho elegante e os sapatos engraxados. Seu cabelo esta bem penteado e firme. Sentiu-se alinhado, até esquecendo dos momentos fúnebres que anteciparam esta sua inda, sabe-se lá pra onde. Carregava uma pasta bonita de couro. Deixou suas pernas lhe guiarem, quando se viu adentrar um luxuoso prédio na sete de Setembro. Realmente era um homem importante na sociedade; um empresário da alta classe; um advogado bem sucedido, quem sabe?... ; a motriz do sistema invólucro contemporâneo. O sorriso alegrou-lhe a face consternada pela dúvida. O ascensorista perguntou:
- Doutor Guilherme! – Apertou o andar 23 – Vamos que vamos. Bom dia meninas. – Algumas mulheres do elevador responderam. – Bom dia meninos. – Houve um pequeno silêncio. – Os meninos são sempre assim. – O senhor Ascensorista entreabriu um confesso sorriso. Virou para nosso protagonista e indagou - Como anda o escritório? Em ponto de bala?
- Alguns tiros saindo pela culatra, outros acertando o alvo em cheio. – Não sabendo o que responder, fez este breve comentário estúpido.
- É né? Mas a vida é isso mesmo Doutor. Que nem o meu trabalho; altos e baixos. – A porta se abriu – Bem, Boa sorte Dr. Guilherme. – Ouvindo o senhor, abriu espaço entre outros presentes no elevador, e saltou no andar. O sol cegou sua vista, fazendo com que, num reflexo instintivo, cobrisse a têmpora com a palma da mão, tal qual uma viseira. Aproximou-se da janela e olhou a paisagem. Lá de cima via-se todo o centro da cidade, o horizonte era magnífico, estonteante; um poeta choraria. O dia estava quente, enquanto as pessoas andavam cegas atravessando a rua de um lado pra outro, num frenesi traumático. O vento lhe borrifou um agradável aroma de perfume, olhando para o lado ele vê uma mulher gostosa de aproximadamente um metro e oitenta de altura, loira, coxas carnudas, malhada e a bunda de satã.
- Doutor, o senhor esta atrasado para a reunião sobre o orçamento anual da empresa. Estávamos apenas esperando o Senhor chegar. – Ela realmente seria muito bonita, se não tivesse uma cara de puta. Tinha um sorriso cínico e um olhar mentiroso. Estava na cara que seria apenas por uma noite, ou até o seu dinheiro acabar. Todavia ele a olhou desconcertado, parecia gostar deste tipo de mulheres, promiscua cheia de excitação e putaria. A olhou desejando todos os poros de sua pele, cada fio de seu pelo hirto e junto o espirro de sua boceta.
- Já estou indo. – Falou de forma ríspida e olhar frio, como se concentrasse em algo. Queria esconder que não fazia a mínima idéia do que acontecia ali. Sorriu de si mesmo, no momento em que a secretária lhe dava a bunda pra espiar indo pra sala. Sua imaginação floriu inconscientemente, despertando uma imensa volúpia ao olhar aquela bunda se mexendo lentamente. Ficou meio catatônico a imaginar como seria ter ela em sua boca; beijar e chafurdar em sua intensidade lascívia. Guilherme voltou a olhar pela janela deixando o sol queimar sua face, servindo de motriz pro seu raciocínio dividido em matizes de incompreensão. Não conseguia mais destingir a realidade dos sonhos, a mancha ia crescendo e misturando as cores, fazendo-se perder os tons; do que é o que. Deixou-se levar pela mescla de tonalidades, mergulhando nas possibilidades aparentes. Não importa o real, ou não real, importa é a vida, o único vício que se presa. Guilherme é um contaminado inveterado por tudo aquilo que lhe ocupa a mente longe de si. Provavelmente nunca se viu; igualmente pessoas continuavam correndo como formigas, atravessando de um lado a outro, esquecendo das paixões, de suas metas reais e aceitando tudo que lhe impõe. Os prédios amenizavam a claridade, todavia não evitava os raios solares. Era um dia cálido e o asfalto, se observado ao longe, expirava densos hálitos de calor. O desejo aflorava junto ao sol. A cordialidade da luz trazia os sonhos mais loucos, e nem o medo de viver, arrancaria as raízes de sentimentos tão intensos. A vida revigorou em seu coração, no instante que ele se virava para adentrar a sala de reuniões. A confusão martelou seus sentidos de maneira perturbadora.
“O que faço aqui? Cumpro meu dever. Mas dever com quem? Comigo. Família? Não sei... Tenho uma? A verdade é que não sei mais... Você sabe. Talvez eu tenha feito; seguido; alcançado; brigado; almejado; buscado; conquistado o sonho que tanto fantasiei. Ou tudo não passou de uma fantasia realmente. Aqui pareço ter uma boa vida; status; poder; respeito; um bom salário; não me parece ser tão difícil; aqui sou eu, sou muito mais eu”.
Seu reflexo estampado no vidro da porta o acalmou.
“Sim... Agora sim”. Suas mãos contornavam o queixo e ia deslizando por toda face, tentando reconhecer a pele que lhe adornava.
“Na entrada da sala um pé teima em uma dormência, parecia que ele queria ir a outro lugar. Puxei a perna, já que o pé é preso nesta, e entrei no recinto com todos me olhando assustado, alguns com cara de palhaço, num meio sorriso. Não encarei ninguém, apenas maldisse de minha cena ridícula em sussurros. A sala estava cheia. Havia uma mesa grande no centro e, meio oval, apenas restava um lugar, provavelmente o meu. Sentei-me e comei a dar uma olhada nos papéis que estavam a minha frente; contratos, portifólio; planilhas; contas; estimativas; números; N; contratos; discrições; orçamento; e um filha da puta em pé na minha frente com cara de cu. Aquilo tudo me parecia muito bom inicialmente, mas algo arranhava em minhas entranhas e não podia ser o café da manhã. Comecei a folhear a pasta que aguardava minhas objeções em minha frente; cortes; verbas; vínculos empregatícios; terceirização; contratações; estimativas; cálculos; e meu estômago me avisando sobre algo que eu não fazia a mínima idéia do que poderia ser. Bebi um copo d’água e voltei-me pra pasta. A gravata apertava minha garganta e tive uma crise de falta de ar, enquanto minha testa apresentou o primeiro indício de uma lágrima de suor. Enxuguei a face com o lenço e bebi mais um gole de água. Não escutava direito o que me dizia o interlocutor da reunião. Tentei focar em suas palavras, entretanto me pareceu meio confuso; algo sobre corte de funcionários; talvez sobre a importância dos acionistas; quem sabe a fórmula do crescimento dentro das estimativas de mercado. A minha volta todos folheando suas pastas, alguns entediados, outros entretidos. O que se diferenciava, eram os olhos. Olhos esbugalhados no mais extenso frenesi, composto por um turbilhão incansável pela falta de tempo. O ar de cafeína perfumava o ambiente, na verdade impregnava. Mais olhos mortos cheios de dor, furiosos e ambiciosos. Talvez o morto ali seja eu, por não compartilhar das mesmas filosofias furibundas. Não sei como havia chegado até este cargo, precisava fazer algo a respeito. Afrouxei a gravata e tirei o paletó num movimento lento e singelo. Pessoas me olharam desconcertadas, só pude lamentar e colocar o paletó atrás de minha cadeira, pendurada no encosto. A reunião prosseguiu num ritmo rápido, eu não conseguia entender algumas palavras. Minha velocidade caia gradualmente, no tempo em que minha testa voltou a sentir o calor insuportável que me consumia. Abri um pouco a camisa, deixando um pouco dos meus pêlos do peito saltarem, deixando um ar de repugnância e desejo na sala. Continuava indiferente no ambiente, apesar de sentir o desconforto alheio.
- Com licença – Levantei-me em movimentos lentos e confiantes. Cansado de ser o insuportável, esqueci o que me falavam da extremidade da mesa oval. Dei de cara com a secretária, uma feição impaciente e preocupada complementava seu estilo de puta.
- Esta tudo bem com você, Dr. Guilherme? – Parei estático e, apático, encarei-a de frente. Ela continuava me olhando com receio.
- Não estou me sentindo muito bem, vou me confinar em minha sala. Fale que eu estou com dores terríveis de cabeça. – Voltei andar em direção a sala, mas tinham inúmeras salas, estava meio perdido, então tomei o caminho da direita.
- Dr. Guilherme, sua sala é pro outro lado. – Ela sorriu. Gostei do som de seu riso. Realmente excitante. Caminhei até uma sala onde havia uma foto minha com uma mulher de uns quarenta anos. Não fazia a puta idéia de quem poderia ser. Porém, parecíamos bem juntos. Sentei na frente do computador e o liguei. Comecei a mexer em tudo na minha frente. A maioria documentos e contratos. Algumas passagens descansavam em uma gaveta; conexão Rio/ São Paulo. A sala é composta com uma estante, um computador, uma escrivaninha e um sofá. A janela é coberta por um vidro escuro, não deixando o sol iluminar direito a sala, ainda mais porque a cortina esta fechada. Sentei na frente do computador e comecei a vasculhar os arquivos de uma pasta chamada; Planilhas. Automaticamente meu Msn apareceu ligado, na tela piscou o nome Cristina perguntando se eu estava ali. Decidi ignorar. Mas esta mulher me pareceu alguém bastante insistente, beirando a inconveniência.
- Fale comigo. Precisamos conversar. Não dá mais pra sustentar este seu silêncio. – Algo despertou minha curiosidade. Não fazia a puta idéia de quem seria, mesmo assim dei corda.
- Sim?
- Por q vc está fugindo de mim?
- Eu não estou fugindo.
- ta sim! – um míni desenho animado saltou a tela, escrotamente.
- Então vamos nos encontrar.
- Claro.
- Que dia?
- Amanhã no CCBB.
- Que horas?
- Na hora do almoço. Umas duas horas. – Não esperei ela responder. Desliguei a porra do Msn e o terror de súbito reaparece na tela do Computador. O rosto desconhecido me perseguia grudado em meu pescoço. O reflexo mostrou meu temor em carne e vida; como voltou à tona esta face tão desconhecida? Este rosto não é meu. Tentei arrancar minha cabeça num movimento violento, no tempo em que certa tristeza se apoderava de meus sentidos. Em meio ao meu colapso, derrubo o computador no chão, fazendo-o em alguns pedaços. A secretária entra assustada com cara de cu.
- Meu Deus Dr. Guilherme o que esta acontecendo? – E eu não sabia a puta idéia do que estava acontecendo. Ela grita por ajuda e eu corro em direção ao elevador, precisava dar o fora desta irracionalidade; precisava me reencontrar. O elevador não havia chegado, vindo uma multidão ao me redor, correndo com palavras de ordem inexpressivas e sem sentido. Imediatamente corri para a escada e comecei a descer com alguns idiotas ainda ao meu encalço. Logo todos corriam atrás de mim pelas escadas. A escadaria estava meio escura, não dando para perceber o que era o que, quem era quem. A única figura certa que podemos apontar; eu descendo as escadas num pânico nunca vivido, nem no seqüestro relâmpago em que sofri temi tanto. O medo não era apenas do breu que se alastrava sobre minha pessoa, e sim pela razão que se esvaía sob meus dedos trêmulos e inseguros; de que adianta os sentidos se eles não significam nada? Meus reflexos me deram uma rasteira em plena corrida, dando uma impressão desleal de desequilíbrio. Entretanto, justamente este falso movimento me fez cair sublime sobre um dos degraus e me partindo as costelas. A dor lancinante explodiu meus pulmões em pequenas gotículas de sangue; fora realmente extraordinário; e eu não fazia a puta idéia do que estava acontecendo".